Tanzânia · 4 julho 2022 · 9 Min
The Aga Khan Health Services (AKHS) manages health operations in eight low- and middle-income countries (LMICs), encompassing around 500 health facilities and hospitals. Its operations span all
Os Serviços Aga Khan para a Saúde (AKHS) gerem operações em saúde em oito países com baixos e médios rendimentos (LMIC), englobando cerca de 500 unidades de saúde e hospitais. As suas operações abrangem todos os níveis dos sistemas de saúde e dão uma atenção especial aos cuidados de saúde primários integrais.
No final de 2019, os AKHS foram incumbidos de atingir a neutralidade carbónica nas suas operações até, se não antes, 2030. Como resposta, definiu uma estratégia que começou com uma avaliação comparativa da sua pegada de carbono, desenvolvendo e implementando planos para a redução das emissões e partilhando as lições aprendidas com outras partes interessadas a nível local – nomeadamente com os governos – com vista a um impacto mais alargado. A equipa desenvolveu uma ferramenta inovadora de avaliação comparativa das emissões de carbono que está a atrair organizações de todo o mundo.
“Um dos princípios éticos da AKDN é efetuar uma boa administração. Nos AKHS, levamos este princípio a sério e tentamos reduzir a nossa pegada de carbono sempre que nos é possível.” Dr. Gijs Walraven, Diretor de Saúde da AKDN
A Dra. Fawzia Rasheed é Consultora Sénior do Diretor de Saúde da AKDN. É doutorada pela Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres e tem uma vasta experiência na colaboração com ministérios da saúde e agências da ONU para a criação de novas iniciativas. O seu papel na dinamização do compromisso ambiental dos AKHS reúne os seus interesses em natureza, investigação médica e na resolução de problemas. Aqui, Fawzia fala-nos da criação da ferramenta de avaliação de emissões e como esta constitui um claro estudo de caso para as organizações que querem reduzir a sua pegada de carbono.
Quando foi estabelecido o objetivo de nos tornarmos neutros em carbono até 2030, não sabíamos se esse era um objetivo realista – as Chinas e as Américas deste mundo estão a apontar para 2050. E nós, na AKDN, trabalhamos em várias áreas, da indústria aos cuidados de saúde, áreas que são particularmente poluentes em relação a outros sectores. Quando começámos, a opinião predominante era que os LMIC não se deveriam preocupar com iniciativas de descarbonização, uma vez que a maioria das emissões de carbono era gerada por países mais ricos. As oportunidades de financiamento para os países mais pobres foram e continuam a ser adaptadas às alterações climáticas – preparando-se para mais surtos de malária e assim por diante. A ideia à volta da neutralidade carbónica era que seria caro.
Mas a AKDN é uma organização privilegiada, com pessoas muito talentosas e com uma dimensão de trabalho incrivelmente abrangente, o que torna únicas as possibilidades de fazer coisas novas e colocar em prática grandes ideias. Penso que seremos pioneiros nesta área, mostraremos aos outros o caminho a percorrer para ir mais depressa e não facilitaremos quem quiser ir mais devagar.
Como nasceu esta ferramenta de avaliação de emissões?
Os AKHS já vinham trabalhando em medidas amigas do clima, com destaque para a manutenção da saúde das populações, e para evitarmos cuidados de saúde desnecessários, praticamos uma medicina baseada em evidências, o que limita o número de consultas e intervenções desnecessárias. Também usamos tecnologia para que os cuidados de saúde sejam prestados o mais próximo possível dos pacientes.
Vínhamos realizando uma série de iniciativas que faziam sentido ao nível da gestão e das finanças, e que também eram mais ecológicas, desde a redução do uso de plástico ao uso de energia solar e a partilha de automóveis. Uma vez que fiquei responsável pelas práticas ecológicas, pesquisei e escrevi textos sobre coisas específicas e óbvias, como escolher produtos menos intensivos em carbono, diminuir o consumo de carne, açúcar e alimentos processados em cantinas, examinar o que se compra e as embalagens associadas, a eliminação de resíduos, o uso de transportes e assim por diante, e depois falei com os funcionários de cada sector. Houve um entusiasmo geral nos vários países, pelo que decidi pôr em contacto aqueles que estavam a trabalhar em questões semelhantes de modo a dar início à aprendizagem dos vários tipos de operações. Os funcionários foram rápidos na identificação de soluções e o progresso alcançado foi partilhado com vista a inspirar outros e terem um envolvimento semelhante. Os funcionários também se envolveram em projetos comunitários, como a plantação de manguezais, e continuaram a procurar novas oportunidades.
Precisávamos de dados concretos para identificar as áreas em que poderíamos fazer uma maior diferença e acompanhar o progresso alcançado com as nossas intervenções. Começámos a usar as ferramentas de medição geralmente disponíveis, mas eram ineficientes e difíceis de usar, e cada uma exigia orientação. Muitas das ferramentas de avaliação exigiam consultores ou um pagamento para a sua utilização. Precisávamos de uma ferramenta fácil de usar que realizasse as funções básicas, mas que também calculasse itens específicos para o sector da saúde, incluindo os produtos que compramos, dado que estes representam uma grande parte da nossa pegada de carbono. Com apoio técnico, e em colaboração com a Universidade Aga Khan, concebemos uma ferramenta que utilizaria os dados mais recentes, seria abrangente, simples de utilizar e suficientemente leve para poder ser partilhada por e-mail e utilizada offline. Incorporámos o feedback dos funcionários e partilhámos os recursos com um painel de especialistas organizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a qual aprovou a nossa abordagem.
Que informações os AKHS obtiveram com esta ferramenta?
A ferramenta mostrou-nos que os itens pelos quais os AKHS n
A ferramenta mostrou-nos que os itens pelos quais os AKHS não são diretamente responsáveis – incluindo produtos e serviços adquiridos – representavam cerca de 80% da nossa pegada de carbono. Das áreas em que temos um controlo direto, 47% das nossas emissões foram geradas pela eletricidade da rede, seguida pelos geradores com 26%, gases anestésicos com 9%, refrigerantes e viagens com 8% cada e resíduos com 2%.
Como seria de esperar, os cuidados primários e de proximidade tiveram uma pegada muito menor do que as operações hospitalares. Os transportes representaram a maior fatia das emissões diretas de carbono no trabalho de proximidade; ao nível das instalações, o funcionamento de equipamentos e o aquecimento e arrefecimento dos edifícios foram os principais responsáveis. A ferramenta também ofereceu informações inesperadas: uma das unidades tinha uma fuga de gases anestésicos, e outra podia poupar dinheiro e emissões através da mudança do sistema de ar condicionado.
Em que medida é que a redução das emissões leva a uma poupança financeira e a uma melhoria dos serviços?
Começámos a trabalhar com os países que em conjunto representam 55 por cento da nossa pegada, a Tanzânia, o Paquistão e o Quénia, para efetuarmos lá o primeiro grande corte nas emissões de carbono. Durante a recolha de dados ao longo de 2021, as equipas iniciaram algumas medidas de baixo custo ou sem custo com vista à redução das emissões. Foram instaladas incineradoras de alta qualidade na Tanzânia e no Paquistão, que irão reduzir os poluentes atmosféricos. Foram introduzidas novas centrais solares fotovoltaicas no Quénia (Mombaça), Paquistão (Singhal) e Tanzânia (Mwanza), reduzindo em 6% o impacto de carbono decorrente do uso de eletricidade. Na Tanzânia, foram instalados sistemas de aquecimento solar no lugar do diesel, poupando 61 299 dólares por ano, e as películas de raios-X e ultrassons foram substituídas por relatórios digitais. O recurso a reuniões virtuais, teleconsultas e e-learning, acelerados pelas restrições da Covid-19, estão também a reduzir as emissões e as despesas.
A ferramenta revelou um claro argumento económico em relação às medidas necessárias para reduzir a nossa pegada de carbono, particularmente face ao aumento dos preços do petróleo. Com países como o Afeganistão e a Síria a passarem por prolongadas falhas de energia, também se mostrou evidente que, se não tivéssemos a nossa própria oferta de energia renovável em vigor, a prestação de serviços de saúde ficaria em risco. Com a energia solar e as baterias, poderíamos reduzir a nossa dependência das importações caras de diesel e poderíamos manter os serviços em funcionamento. De seguida, avaliámos de forma sistemática o impacto e os custos das medidas de poupança de energia e dos investimentos em energias renováveis e equipamentos eficientes a nível energético.
O custo das melhorias em áreas como iluminação, refrigeração, bombas, frigoríficos, isolamento, veículos elétricos e painéis solares foi de 11,7 milhões de dólares. Estes valores (juntamente com as alterações sem custos no uso de gases anestésicos) foram projetados para reduzir as emissões de carbono dos AKHS de 12 385 para 5311 toneladas, ou seja, um corte de 57%. Com os custos atuais da energia e combustível, isso traduzir-se-ia numa amortização em pouco mais de cinco anos – uma recuperação anual de 20% em relação ao investimento.
Num momento em que o sector da saúde estava preocupado com a pandemia, os colegas foram capazes de se empenhar nas iniciativas climáticas?
É notável aquilo que os funcionários fizeram perante um cenário de Covid-19. Tiveram de ultrapassar uma calamidade atrás da outra. Os funcionários trabalharam de forma ininterrupta, com medidas de segurança para si, os seus pacientes e as suas famílias. Mas as pessoas perceberam que a história da Covid-19 está diretamente relacionada com os problemas do nosso planeta e que os profissionais de saúde irão continuar a enfrentar problemas se não agirmos de forma concertada.
Acredito em trabalhar com as pessoas para identificar soluções baseadas em cada conjunto de capacidades e cada realidade. Não falei com uma única pessoa com quem não partilhasse as mesmas preocupações. Para além de criarmos sistemas para a recolha de dados e a identificação daquilo que precisava de ser feito, identificámos em conjunto os projetos que melhor se encaixavam nos interesses e capacidades das equipas e que poderiam ser levados por diante, transformando preocupações em algo positivo. Criámos grupos de WhatsApp onde eu partilhava com os pontos de contacto aquilo que estávamos a fazer, algo que ajudou a criar uma comunidade dinâmica. Manter o diálogo e as trocas interpessoais também foi importante para que todos nós permanecêssemos animados perante as notícias frequentemente deprimentes.
Passar da avaliação à implementação estratégica depende da consciencialização e da criação de um movimento entre os funcionários. A mudança de comportamentos precisa de uma compreensão e aceitação alargadas, é uma corrente de que todos têm de fazer parte. Temos uma lista de cerca de 150 pessoas diretamente responsáveis por vários aspetos deste trabalho nos AKHS, e há muitas outras também envolvidas.
Realizámos um exercício de brainstorming com as equipas a partir da pergunta: “Se o dinheiro não fosse problema, que poderíamos fazer para reduzir a nossa pegada?” As medidas em que pensaram equivaleriam a uma redução de 60% na nossa pegada. Ainda não concluímos o exercício – ainda há muito mais que podemos fazer antes de considerarmos inserções ou compensações para atingir a neutralidade carbónica.
Nem todas as ideias puderam ser automaticamente posta em ação, dado que em muitos casos eram necessários fundos para isso. Como tal, embora tenhamos feito progressos com intervenções sem custos ou de baixo custo, as coisas não avançaram muito rapidamente. Mas agora virámos uma esquina ao apresentarmos ótimos argumentos económicos com vista a investimentos, tendo recebido financiamento para arrancarmos. Também estamos a conseguir progressos ao nível da formação, para que outros usem os nossos métodos, e desenvolvemos materiais de formação autónomos para possibilitar um impacto mais alargado. Estamos a desenvolver um sistema de formação sistemática para os nossos funcionários, como parte de um desenvolvimento de carreira, e a fazer experiências para perceber a melhor forma de formalizar aquilo que as pessoas fazem neste contexto como parte formal da sua descrição de funções e avaliações de desempenho, para que haja um reconhecimento total daquilo que tem sido até agora trabalho voluntário.
Os funcionários têm vindo a escrever resumos para conferências e a candidatar-se a prémios pelo seu trabalho. O British Medical Journal e o The Lancet pediram-me, em nome dos AKHS, que escrevêssemos artigos para eles. Sei em que é que os nossos resultados são promissores e bons para desenhar perfis e partilhar com terceiros. Com apoio, as nossas equipas fizeram um esboço para apresentar a essas publicações e acabámos de saber que foram aceites mais outros dois artigos, o que é ótimo.
Os nossos funcionários no terreno também estão a fazer apresentações a entidades governamentais e a treinar para darem orientações nos próprios países e idiomas. Estamos a construir um número impressionante de promotores no interior da rede. Tudo isto tem sido possível graças a um apoio ativo por parte da direção, particularmente do Gijs e dos nossos presidentes regionais e nacionais – houve muitos funcionários com tempo investido neste trabalho.
Como estão a usar a ferramenta para adotar medidas?
Esperamos alcançar reduções acentuadas de emissões de carbono nós mesmos, particularmente ao nível dos cuidados de saúde primários. Estamos numa boa posição para persuadir os decisores políticos e investidores a adotarem abordagens semelhantes e expandi-las. Temos uma alta visibilidade e estamos a participar em debates e fóruns influentes – as nossas posições de confiança há muito construídas junto dos governos e do público irão ajudar. Também temos, através da rede da AKDN, muitas oportunidades de inovação e pensamento criativo.
Começámos agora a abrir as nossas portas ao público e estamos preparados para lidar com um grande nível de interesse. Temos um manual passo-a-passo e estamos a trabalhar numa série de vídeos para acompanhá-lo. Tivemos cerca de quatro sessões de orientação e esperamos continuar a realizá-las regularmente. Até agora, participaram e solicitaram a ferramenta universidades como Yale e a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, grupos de consultoria, C40, uma rede de cidades que já tem 96 membros, o Standard Chartered Bank, a Iniciativa Clinton de Acesso à Saúde e o Fundo Global. Faço parte do comité de administração para a ação climática da Federação Internacional de Hospitais, que trabalha em 92 países. Desenvolveram uma iniciativa para examinar a forma como podem envolver todos os seus membros na “ecologização” dos cuidados de saúde. Espero que se interessem pelo uso da ferramenta – a avaliação comparativa é algo que cada vez mais todas as atividades de saúde serão solicitadas a fazer. E daqui a algumas semanas, a OMS irá organizar uma reunião com mais de 25 países representados (ministérios da saúde e do ambiente) e nós iremos realizar um workshop de formadores para todos os participantes.
A ferramenta de avaliação de emissões é gratuita e está aberta a todos. Saiba mais com o nosso guia, e para aceder à ferramenta, escreva para [email protected]