Agência Aga Khan para o Habitat
Tajiquistão · 24 março 2023 · 7 Min
A água é fundamental para o desenvolvimento humano. O fácil acesso a água potável, bem como casas de banho e informações sobre higiene, reduz as doenças, permite que as raparigas, em particular, frequentem escolas equipadas com casas de banho e evita que mulheres e crianças tenham de fazer fila e transportar água durante, em média, 90 minutos por dia. As infraestruturas como canais de irrigação, de acesso equitativo, fornecem água para a agricultura e pecuária. A produção de energia e a maioria das indústrias também dependem de fontes de água fiáveis.
Com dois por cento da sua área coberta por lagos, e quase mil rios, o Tajiquistão possui água doce em abundância. Mais de 95% da sua eletricidade é fornecida por energia hidroelétrica. No entanto, a localização remota de grande parte da população tajique dificulta o fornecimento e a manutenção das infraestruturas hídricas. Em 2019, o Banco Mundial concluiu que 43% dos habitantes não tinham instalações sanitárias básicas, enquanto 35% não tinham serviços de água potável. Ao mesmo tempo, as cheias e deslizamentos de terras decorrentes do rebentamento de lagos glaciais e águas superficiais metem as vidas em risco: a água é, na mesma medida, um perigo e um recurso.
A pressão sobre os recursos naturais partilhados, com potencial para criar conflitos dentro e fora das fronteiras nacionais, é intensificada pelas alterações climáticas. Por exemplo, um estudo da Universidade da Ásia Central (UCA) mostra que, apesar de a população em Sughd estar a crescer, a diminuição da chuva no inverno e a perda de glaciares estão a ameaçar a disponibilidade de água no rio Isfara, vital para a agricultura.
Como resposta, a Estratégia Nacional de Desenvolvimento da República do Tajiquistão para o Período até 2030 confirma a necessidade da irrigação e de uma gestão eficaz da água para o desenvolvimento agrícola, o potencial da energia hidroelétrica para a segurança energética, e as exigências da economia nacional e da população em crescimento ao nível do investimento em infraestruturas hídricas.
Há quase três décadas que a AKDN trabalha com o Governo do Tajiquistão e outros parceiros internacionais para melhorar o acesso à água para beber, lavar e irrigar. A Fundação Aga Khan (AKF) já implementou até à data 600 sistemas de irrigação. Estes melhoraram a gestão dos terrenos e aumentaram a produtividade agrícola, ajudando cerca de 720 000 pessoas a aumentarem a sua segurança alimentar e financeira.
Kishwar Abdulalishoev, Presidente da AKF Tajiquistão
Um programa recente, “Melhorar a estabilidade e a gestão dos recursos naturais no Tajiquistão e no Quirguistão”, ajudou a reduzir o conflito na fronteira, trabalhando com organizações de gestão de água e pastagens em áreas transfronteiriças para melhorar o acesso e a gestão da água para irrigação, para consumo humano e para as pastagens. Mais de 100 locais foram reabilitados, incluindo melhorias nos canais de irrigação, sistemas de água potável, rotas de acesso a pastagens e instalações veterinárias e bebedouros para o gado.
O programa integrado quadrienal de Melhoria da Saúde e do Habitat, financiado pela Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, construiu sistemas de abastecimento de água potável que servem quase 144 000 pessoas no Vale do Rasht e 42 000 pessoas em Khatlon, em conjunto com casas de banho em unidades escolares. O programa providenciou formação em gestão de bacias hidrográficas, bioengenharia dos solos e gestão de recursos naturais, fortalecendo a capacidade do governo local de sustentar as melhorias.
Jahongir Olimov, gestor de projeto da Agência Aga Khan para o Habitat (AKAH), em Balkh, Khatlon
A nossa experiência no envolvimento comunitário e no desenvolvimento de infraestruturas está a ser usado para o Thrive Tajikistan, um projeto quinquenal apoiado pela USAID. O programa integra intervenções em saúde, nutrição, agricultura e capacitação económica para comunidades vulneráveis, com o objetivo de chegar a 165 000 beneficiários diretos e 460 000 indiretos. A água, seja vista como uma necessidade escassa ou como uma ameaça existencial na forma de uma inundação glacial, é um elemento fundamental do programa.
Khatlon, onde estão quase 80% das culturas do Tajiquistão, é uma das regiões mais secas. Uma população em crescimento, uma irrigação ineficiente e uma diminuição da neve estão a exacerbar a escassez de água. “Apesar de vivermos à beira do rio Panj, temos uma grave escassez de água”, diz Karimova Shamigul, da aldeia de Chubek, em Hamadoni, Khatlon. “Recolhemos água dos canais do rio e a guardamo-la em vasilhas. Há anos que bebemos água barrenta.”
O Thrive está a trabalhar em estreita colaboração com a administração e as comunidades locais para fornecer água potável, infraestruturas de saneamento, e educação em saúde e higiene a mais de 12 000 pessoas. As famílias e as instituições pagam uma tarifa de água para manter os sistemas. “Agora o nosso problema acabou”, diz Sulaymonov Yorahmad, da aldeia de Chubek. "Temos aqui água disponível durante 24 horas."
Turdalieva Zebunisso, Aldeia de Surkhob, Distrito de Farkhor, Khatlon
Rasulov Safarkhuja, da mesma aldeia, explica como a sua família também costumava recolher e ferver a água da chuva. Em ocasiões especiais, pagavam 10 somones (84 cêntimos) por um cilindro de 200 litros de um camião-tanque. Isto dava para três a quatro dias. O sistema de abastecimento de água do Thrive fornece água potável por 20-30 somones (1,60-2,5 €) por mês. “Agora temos água em todas as casas, o que é muito conveniente. Os meus netos e os meus filhos já não vão ter de se preocupar mais com a água para beber e eu já não vou ter de me preocupar com a saúde deles”, disse Rasulov.
Até ao final de 2023, o projeto Thrive irá construir 14 sistemas de abastecimento de água que irão servir mais de 41 000 pessoas e 14 casas de banho escolares para mais de 8000 alunos e professores em Khatlon e no GBAO. A sustentabilidade ambiental é aumentada pela redução das fugas de água nas novas tubagens, a formação dada sobre conservação, e os medidores de água que permitem aos utilizadores saberem a quantidade de água que consomem. As pequenas taxas de utilização também levam a um consumo mais responsável e ajudam os sistemas a alcançar a sustentabilidade financeira. Os canalizadores de cada aldeia recebem formação para realizarem a operação e manutenção.
Com o crescimento populacional, a industrialização e o degelo glacial a ameaçarem o abastecimento de água a longo prazo, a criação de um futuro sustentável tem de ir para além da resposta às necessidades apenas das próximas gerações. A Agência Aga Khan para o Habitat realizou avaliações de habitat numa área com 145 000 pessoas, e essas informações estão a ser utilizadas para preparar o planeamento, construção e proteção de infraestruturas hídricas. Está a trabalhar com o Comité de Proteção Ambiental, Hydromet, e o Comité de Situações de Emergência e Defesa Civil para mapear e monitorizar os perigos naturais e os riscos com os níveis das bacias hidrográficas. A avaliação dos 37 lagos glaciais com vista ao planeamento da resposta a desastres permitiu criar mais de 700 planos de gestão de desastres ao nível das aldeias e está a servir de modelo para outras organizações gerirem os recursos hídricos disponíveis. A instalação da central hidroelétrica no âmbito do projeto Thrive reduz a desflorestação e as emissões de carbono e melhora a vida dos habitantes que já não precisam de perder tempo a apanhar lenha e nem a ficar com problemas respiratórios devido ao fumo.
Esta semana, o Governo do Tajiquistão está a coorganizar a Conferência da Água da ONU de 2023. A AKDN contribuiu para os preparativos do Governo e está a participar em eventos em conjunto com ministérios governamentais e parceiros internacionais.
A AKF, o Fundo Aga Khan para o Desenvolvimento Económico e a Universidade da Ásia Central coorganizaram um evento intitulado “Adotar o Nexo Água-Energia-Alimentação-Ambiente para uma transição energética ao nível da água”, com o Ministério da Energia e Recursos Hídricos do Tajiquistão e outros parceiros. Debateram acerca da crescente lacuna em matéria de armazenamento de água que o mundo está a enfrentar, com o objetivo de tomar melhores decisões relativamente à sua gestão.
A AKAH participou no evento Parceria e Cooperação para a Água e numa sessão sobre a colocação da água no centro do desenvolvimento urbano. O Cientista-Chefe da AKAH, Deo Raj Gurung, explicou como a AKAH pode incorporar o conhecimento científico, assim como estimular soluções práticas em colaboração com comunidades, governos e outros intervenientes. Ele comentou que, quando os cientistas e os decisores políticos colaboram no início do processo de planeamento, eles conseguem assegurar que a investigação será relevante para a formulação de políticas eficazes.
2025 foi declarado como o Ano Internacional da Preservação dos Glaciares numa iniciativa patrocinada pelo Tajiquistão, demonstrando o compromisso do país em mitigar os efeitos das alterações climáticas nas sociedades de montanha da região. O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse: “Muito obrigado ao presidente Rahmon do Tajiquistão por liderar a iniciativa de colocar o foco global na preservação dos glaciares do mundo... Eles representam o maior reservatório de água doce do planeta – e apoiam a nossa nutrição, saúde, economias e produção de energia. E quase dois mil milhões de pessoas – uma em cada quatro pessoas na Terra – vivem em áreas abastecidas de água pelos glaciares e pelo degelo sazonal da neve.