Por Mr. Sam Pickens, Hyderabad, Índia · 25 maio 2019 · 8 Min
Diretor das Academias, Salim Bhatia
Administrador da Academia, Dr. Geoffrey Fisher
Ilustres convidados
Boa noite aos pais e à Turma de 2019
Eu não sou VIP nem uma celebridade, por isso gostaria de começar por elencar as minhas qualificações para fazer este discurso. Eu cresci no sul da Índia quando Indira Gandhi, a avó de Rahul, estava no poder. MGR, cujos filmes de ação eu adorava em criança, era ministro-chefe de Tamil Nadu. Aprendi a tocar miridungam.
Frequentei uma escola residencial na Índia muito parecida com a vossa. Era um jovem ambicioso e fui estudar literatura para os Estados Unidos. Depois, mudei-me para a Suíça. Ao longo do meu percurso, trabalhei no mercado editorial, em marketing para o sector comercial e na área da comunicação para a Rede Aga Khan para o Desenvolvimento. Publiquei dois livros sobre a história cultural de Marrocos. Tive dois filhos. A minha primeira mulher faleceu. Sofri um ataque cardíaco. Voltei a casar e tive mais dois filhos. Tenho quase 60 anos.
Portanto, esta vida agitada mas plena sugere que eu deva ter aprendido várias coisas importantes ao longo do meu caminho e que, por isso, tenho algo a transmitir-vos, algo valioso, como os oradores em sessões de graduação costumam fazer - uma abordagem à vida que vos possa tocar.
Neste momento crucial das vossas vidas, gostaria de frisar a importância de serem éticos ao longo da vossa vida. Aprendi na minha vida que é muito melhor - para nós e para a sociedade - fazer a coisa certa, mesmo quando a coisa certa é difícil de realizar.
Uma vez que muitos de vocês seguirão agora para o ensino superior, gostaria de começar por falar numa experiência no Seminário Teológico de Princeton, nos Estados Unidos, na década de 1970. A experiência era sobre a história do Bom Samaritano, que fala de um homem que é espancado por ladrões e deixado às portas da morte. Ele é ignorado pelas outras pessoas, mas depois alguém para e cuida do homem agredido. Talvez já conheçam a história, ela é hoje uma referência em muitas sociedades. Existem leis que são, apropriadamente, chamadas de leis do "Bom Samaritano"... Mas voltando à história de Princeton.
Depois de ter sido dito a todos que tinham de escrever um ensaio sobre o Bom Samaritano, os alunos desta turma em particular foram informados de que teriam de ir para o outro lado do polo universitário e apresentar os seus ensaios. A uns foi-lhes dito que se apressassem; aos outros foi-lhes dito que tinham muito tempo.
Enquanto atravessavam o polo, surgiu no caminho deles um homem que parecia ter sido espancado por ladrões e que possivelmente estava moribundo.
A experiência serviu para observar quem iria parar e ajudar o homem - tornando-se assim o proverbial "Bom Samaritano". Os investigadores descobriram existir uma correlação entre a pressa dos estudantes e a percentagem de pessoas que ajudaram o homem. A grande parte dos alunos com pressa não parou: apenas 10% ajudaram o homem. Mas 40% dos estudantes que não estavam com pressa ajudaram o homem.
Talvez o mais surpreendente seja que 60% dos alunos que tiveram tempo para ajudar o homem não o tenham feito.
A investigação levanta a questão: é mais importante ajudar outro ser humano... ou ajudarmo-nos a nós mesmos? Diria que, na época em que estamos, é mais importante do que nunca ser aquela pessoa que perde tempo a ajudar um estranho em dificuldades - ser a pessoa que faz a coisa certa. Isto está na essência de ser uma pessoa ética.
Então como devemos definir com exatidão o que significa ser uma pessoa ética? Os meus pais, um cirurgião e uma enfermeira, deram-me um exemplo discreto e humilde. A Regra de Ouro, que sugere que devemos tratar os outros da forma como gostaríamos de ser tratados, é outro exemplo. Um indicador que me chamou a atenção foi o enquadramento ético da organização na qual trabalho - a Rede Aga Khan para o Desenvolvimento.
O primeiro princípio ético nele contido é a Compaixão. Este diz que os "pobres, os carenciados e os que estão à margem da existência têm um direito moral à compaixão por parte da sociedade". Pensem neste princípio revolucionário: as pessoas pobres têm um direito moral à compaixão. Este princípio aplica-se a muitas coisas e lugares: hospitais e escolas, por exemplo, assim como a conduta e o trabalho do governo, das ONG e das empresas.
A conclusão que se retira é que a compaixão deve ser aplicada de formas que não comprometam a dignidade de uma pessoa. Temos de respeitar a dignidade de uma pessoa e evitar criar uma cultura de dependência da caridade. Lembro-me de Amartya Sen, que publicou "Pobreza e Fomes: Um Ensaio sobre Legitimidade e Carência" em 1981.
Ao estudar o período de fome em Bengala de 1943, durante o qual 3 milhões de pessoas morreram, Sen percebeu que a fome não ocorria apenas porque havia falta de alimentos, mas também devido às desigualdades na distribuição dos alimentos. Foi uma contribuição marcante para o estudo do fenómeno da fome. É importante notar que depois desse período de fome, algumas pessoas do governo indiano resolveram essas desigualdades na distribuição e salvaram muitos milhões de vidas com essa medida. Desde a sua independência, não voltou a haver na Índia GRANDES períodos de fome como o de Bengala.
São precisas pessoas inteligentes para criar soluções como esta - e incluo cada um de vocês nesse grupo. Sintam-se gratos pela inteligência que vos permitiu chegar a este ponto da vossa vida. Lembrem-se de que para serem pessoas éticas têm de cuidar da vossa mente brilhante e da vossa saúde mental. Muitos de vocês estão a iniciar percursos de vida que serão importantes para todos nós. O vosso cérebro é a vossa dádiva ao mundo.
A vossa responsabilidade, enquanto pessoas inteligentes, passa também por se envolverem nas questões da ordem do dia. Para fazê-lo de forma eficaz, deverão possuir competências de liderança, a sabedoria e o conhecimento - para não falar de uma mente desobstruída - para tomar as decisões que tenham impacto na vida de milhões de pessoas - na Índia e em todo o mundo.
A Academia foi colocada aqui, creio eu, com esse objetivo. A sociedade funciona melhor quando permite o espaço e os meios para que os seres humanos atinjam o seu potencial máximo, independentemente da sua origem. A educação e a investigação são os meios através dos quais os indivíduos e as sociedades atingem todo o seu potencial. Esta escola é, portanto, um meio para que vocês - e a sociedade em geral - atinjam o vosso potencial e o potencial da própria escola.
Devo acrescentar que, pela minha experiência, as sociedades que aceitam a diversidade permitem maximizar de uma melhor forma o potencial de todos - por isso temos de defender a diversidade. Quando não celebramos a diversidade, estamos a excluir certas pessoas que podem contribuir com algo vital para a sociedade. Nos Upanixades é dito, "quando ele vir todas as criaturas dentro de seu verdadeiro Eu, então o ciúme, a angústia e o ódio desaparecerão." No Corão é dito que a humanidade foi criada a partir de uma única alma, como homens e mulheres, comunidades e nações, para que as pessoas se possam conhecer. O maior mandamento para os cristãos é "ama o próximo como a ti mesmo".
Uma sociedade diversificada e inclusiva também é uma na qual possamos viver. Em termos simples, não podemos destruir o planeta. É vital modificar, hoje mais do que nunca, a nossa mentalidade acerca da forma como as nossas decisões afetam o meio ambiente. Tive o prazer de me cruzar com crianças do ensino básico que estavam em campanha contra o uso do plástico.
Se quisermos salvar o nosso lar e legar à vossa geração um ambiente social e físico saudável e sustentável, precisamos da vossa ajuda. As vossas soluções irão ajudar-nos a sair desta barafunda. Tenho o prazer de dizer que conheci ontem vários alunos que estou certo de que irão cumprir o seu potencial.
E quando chegarmos a uma posição de poder em que consigamos fazer algo - quando tivermos os meios para salvar o nosso planeta, ou para ter um impacto positivo no nosso mundo - é nossa responsabilidade não apenas agir, mas ser bons administradores dos recursos que se destinam a beneficiar terceiros. Devemos ser dignos de confiança e responsáveis.
Julgo ter abrangido o enquadramento ético que regula o nosso trabalho.
Mas voltemos à história do Bom Samaritano. As pessoas costumam concentrar-se na história, mas não olham para a pessoa que ajuda. Sabiam que os samaritanos, que foram outrora um grupo razoavelmente grande de pessoas, foram mortos quando se revoltaram contra o Império Bizantino? A conversão ao cristianismo e ao islamismo diminuiu ainda mais o seu número. No século XII, eram menos de 2000 em todo o mundo.
Mas a sua história de altruísmo continua viva. Pensem nos Bons Samaritanos de tempos mais modernos, como Gandhi ou Nelson Mandela. Sentimo-nos atraídos por estas pessoas porque elas simbolizam aquilo que significa ser ético na vida. Eles escolheram fazer a coisa certa e para isso fizeram grandes sacrifícios...
Eles promoveram o bem comum em vez de se ajudarem a si mesmos. Eles não escolheram o que era fácil; escolheram o que estava certo. É esse espírito, de nos darmos com generosidade, que fará do nosso mundo um lugar melhor.
Como Sua Alteza o Aga Khan disse há mais de 40 anos:
“Todos nós já vimos exemplos da criatura mais maravilhosa de Deus, a pessoa, seja numa agência governamental, numa empresa ou numa agência de desenvolvimento privada, que é inspirada a dar-se com generosidade, e a ir para além das exigências mecânicas da sua função. Esses homens e mulheres, remunerados ou não, expressam o espírito do voluntário, que é na prática a vontade de melhorar um produto, de tornar uma escola melhor ou uma clínica mais sensível e eficaz. O seu espírito cria novas ideias, resiste ao desânimo, e ao exigir resultados, anima o coração de todas as sociedades competentes."
Julgo que são claras as mensagens nessa citação:
Para concluir esta reflexão e dar-vos os parabéns pelas vossas impressionantes conquistas e futuros brilhantes, pensei em levar-vos de volta ao início deste discurso, que mais não foi do que uma recitação dos altos e baixos da minha vida. A maioria das pessoas terá uma vida com bons e maus momentos. Assim, gostaria de vos ler um pequeno poema de Rumi, o grande poeta persa do século XIII. Este é um poema que enviei aos meus próprios filhos quando tiveram de enfrentar desafios na vida - quando não entraram numa determinada universidade, ou não estiveram bem numa entrevista de emprego, ou não estavam a dar-se bem com a namorada - e espero que vos inspire, tanto nos dias bons como nos dias maus, à medida que seguem o vosso caminho. Chama-se "A Hospedaria":
Ser humano é ser uma hospedaria.
Todas as manhãs uma nova chegada.
Uma alegria, uma depressão, uma maldade,
uma consciência momentânea,
Surgem como um visitante inesperado.
Recebe-os a todos e entretém-nos!
Mesmo que seja uma multidão de mágoas,
que violentamente limpam a tua casa
dos seus móveis,
ainda assim trata honradamente cada hóspede.
Ele pode a estar a libertar-te
para um novo prazer.
O pensamento sombrio, a vergonha, a malícia,
recebe-os à porta a rir e convida-os a entrar.
Agradece por quem quer que venha,
pois cada um foi enviado
como um guia do Além.
(tradução para inglês de Coleman Barks (The Essential Rumi); adaptada para português)
Obrigado.