Por Dr Peter Kalmus , Nairobi, Kenya · 26 fevereiro 2022 · 6 Min
Sua Alteza o Aga Khan;
Princesa Zahra Aga Khan;
Convidado de Honra, Dr. Peter Mathuki, Secretário-Geral da Comunidade da África Oriental;
Presidente Zakir Mahmood e Conselho de Administração da AKU;
Presidente Moyez Alibhai e Conselho Universitário da AKU no Quénia;
Presidente e Vice-Chanceler Sulaiman Shahabuddin;
Senhoras e senhores;
E acima de tudo, vocês, os incríveis finalistas:
Saudações e felicitações. É uma honra dirigir-me hoje a vós, nesta feliz ocasião. Bom trabalho a todos vocês! Partilho o vosso compromisso de melhorar a vida de todos os seres nesta Terra. Quero agradecer o trabalho da AKU na melhoria da qualidade de vida no mundo em desenvolvimento, assim como a liderança que o Príncipe Rahim e a AKDN estão a demonstrar no combate às alterações climáticas e à degradação ambiental.
Parece-me uma altura estranha nos quatro mil milhões e meio de anos de história do nosso planeta para proferir um discurso de final de licenciatura.
Enquanto cientista climático, vejo um meteoro a lançar-se diretamente contra o nosso belíssimo planeta, e continuo sem ver a sociedade ou os líderes mundiais a mobilizarem-se para o impedir. Os combustíveis fósseis estão a aquecer o nosso planeta a um ritmo de um décimo de grau Celsius a cada cinco anos. Isto pode não parecer muito, mas ter um planeta inteiro a aquecer tão rapidamente é impressionante e assustador.
Os desastres a que temos assistido são apenas o começo. A cada fração no aumento da temperatura, os desastres climáticos aumentarão a sua frequência e intensidade. Como socos no estômago da nossa sociedade global, eles irão pôr cada vez mais sobre pressão os sistemas de infraestruturas, sistemas económicos, sistemas de energia, sistemas de alimentos e água, sistemas políticos e ecossistemas.
A causa principal da destruição climática é a queima de combustíveis fósseis. Antes de termos uma indústria baseada em combustíveis fósseis, o planeta encontrava-se em equilíbrio energético. A quantidade de energia que entrava com a luz solar era a mesma que saía para o espaço, permanecendo assim a uma temperatura constante. A queima de gás, carvão e petróleo mudou isso. Continua a empurrar o nosso planeta cada vez mais para fora dos parâmetros de equilíbrio, forçando-o a aquecer.
A crise foi maioritariamente causada pelo Norte Global, com o impacto a atingir o Sul Global mais cedo e mais com mais intensidade. E os poderosos interesses instalados estão a fazer o que podem para bloquear qualquer iniciativa. Então, que podemos nós fazer?
Esta é uma questão com a qual luto há muito tempo.
Há dezasseis anos, eu era um estudante de doutoramento em Física na cidade de Nova Iorque, apaixonado pelo universo e pelos seus mistérios, e muito feliz por finalmente fazer parte da nobre busca pelo conhecimento humano. Tinha interesse em cosmologia – as grandes questões, de onde viemos e para onde vamos.
O ano de 2006 trouxe duas grandes mudanças à minha vida. Primeiro, tornei-me pai, o que foi uma mudança abrangente. Ligou-me ao futuro. Segundo, ouvi uma palestra acerca do tema da Terra estar em desequilíbrio energético e a aquecer. Esta palestra abalou-me. A Terra está em desequilíbrio energético? Esta é uma notícia absolutamente monumental, literalmente a maior história acerca do planeta. Era na altura e é ainda mais hoje.
Comecei a estudar as alterações climáticas. Tentei que a minha universidade mudasse para eletricidade com origem na energia eólica. Só consegui encontrar uma pessoa na universidade que apoiasse a minha causa – e não por falta de tentativas, porque naquela época, quase ninguém se importava com as alterações climáticas. As normas sociais em relação do clima ainda não tinham começado a mudar.
Hoje em dia, as normas sociais estão implícitas mas são crenças partilhadas muito poderosas. São como a mente subconsciente da sociedade. Por exemplo, a crença de que é normal queimar combustíveis fósseis. Claro, está a destruir o nosso planeta, mas é uma coisa normal. Toda a gente o faz.
As normas sociais são como a água que rodeia um peixe. Nadamos nela, a toda a hora. Elas criam a sociedade, elas moldam os seus sistemas e as suas estruturas de poder, mas na maioria das vezes, nem sequer reparamos nelas. São parcialmente responsáveis pelo colapso climático e ecológico, mas também pela asfixiante falta de resposta por parte da humanidade. Aquilo que ainda poderemos ser capazes de salvar está, em grande medida, dependente da rapidez com que sejamos capazes de mudar estas normas.
Com o passar dos anos, fui ficando cada vez mais alarmado e frustrado com a inação climática. Em 2010, a queima de combustíveis fósseis tornou-se profundamente perturbadora para mim. A ligação entre os combustíveis fósseis e o agravamento dos impactos climáticos era demasiado óbvia. Comecei a reduzir as minhas emissões de forma sistemática e científica, começando com as coisas maiores primeiro: deixar de fazer viagens aéreas, andar de bicicleta em vez de automóvel e cortar no uso de energia em casa, entre muitas outras mudanças. Isto ensinou-me três lições valiosas. Primeiro, para mim era divertido viver com menos combustível fóssil. Desenvolveu a minha curiosidade, levou-me a adquirir novos passatempos e levou-me a fazer novos amigos. Em segundo lugar, apercebi-me da forma como todos nós confiamos em vastos sistemas impessoais para todas as nossas necessidades diárias – comida, água, roupas, ruas – tudo. Para sermos capazes de reduzir o uso de combustíveis fósseis a zero, todos estes sistemas vão ter de mudar. E em terceiro lugar, havia muito poucas pessoas dispostas a seguir-me neste tipo de mudanças.
Quando comecei, esperava que as minhas ações inspirassem outras pessoas. Mas diria que cerca de uma em cada cem pessoas está disposta a reduzir sistematicamente as suas emissões. Por isso, ainda que considere ser um gesto muito importante, simplesmente não é, por si só, suficiente.
Em 2012, fiquei tão alarmado que deixei de me conseguir concentrar na astrofísica, e por isso mudei para a ciência climática. Também comecei a falar sobre o tema o máximo que pude. Disseram-me que os cientistas não deviam manifestar-se, mas fi-lo na mesma. Como poderia não fazê-lo, vendo aquilo que vejo e sabendo aquilo que sei?
Temos de nos ajudar uns aos outros a despertar, e rapidamente. Precisamos de milhares de milhões de ativistas climáticos. Precisamos de construir um movimento climático global que seja ainda mais forte do que a indústria de combustíveis fósseis. Precisamos de um grande número de ativistas climáticos empenhados, apaixonados e corajosos. Precisamos de nos unir, com coragem, convicção e criatividade, para parar o meteoro que está a vir na nossa direção. Ninguém está a salvo do aquecimento global. Não nos podemos esconder dele, neste minúsculo, indiviso e pálido ponto azul que é o nosso planeta. Só poderemos ficar em segurança se pararmos este meteoro, e para fazê-lo serão necessárias mudanças profundas na organização da humanidade enquanto sociedade e na forma como vivemos nesta Terra.
O trabalho climático será a principal tarefa da humanidade para o resto deste século: curarmos a Terra, recuperarmos lugares selvagens, adaptarmo-nos a novos desastres e descobrirmos como viver lado a lado uns com os outros e com todas as outras espécies, que têm tanto direito de estar neste planeta quanto nós. Terão de ser construídas infraestruturas e inventadas tecnologias. Terão de ser criadas novas estruturas legais, morais e até espirituais. Terá de ser feita uma nova arte, concebida uma nova economia, e contadas novas histórias. Precisamos que as instituições desenvolvam novas disciplinas e novas formas de pensar, reduzam rapidamente as suas emissões, eduquem o público e criem mudanças sociais. A AKU já está a desempenhar um papel extremamente importante no Sul Global e tem de continuar.
Também precisamos que vocês, os licenciados da Universidade Aga Khan – entre os melhores e mais brilhantes que o mundo tem para oferecer – dediquem as vossas vidas à resolução da maior crise que a humanidade já enfrentou. Contribuam para o conhecimento e a inovação globais. Exijam justiça climática. Tenham a coragem de levantar bons problemas. Sejam a voz dos que não têm voz, de todas as espécies que se estão a extinguir, e das gerações futuras.
Os desastres climáticos irão piorar antes de começar a melhorar. Mas poderemos parar tudo isto se fizermos a escolha coletiva de tratar a crise climática como uma emergência. Imaginem que no futuro viramos esta página, que a vida na Terra entra em processo de recuperação, que a nossa espécie estava à beira da destruição, mas meteu a mão à consciência à última da hora. Prevejo que isso criará um enorme sentimento de solidariedade global, de solidariedade cósmica para com a vida no universo. O meu sonho é poder estar vivo para experienciar um tempo em que finalmente entremos no caminho certo, na direção de uma humanidade mais madura, uma humanidade mais gentil e agradecida, cheia de alegria por simplesmente estar aqui, nesta Terra – um fio na tapeçaria da vida.
Eu sei que um mundo muito melhor é possível. Nenhuma lei da física o impede. Depende de nós. É a jornada de uma vida, e chama por cada um de vocês. Saiam lá para fora e participem.