Por Sua Alteza o Aga Khan, Karachi, Paquistão · 18 março 2023 · 6 Min
Bismillah-ir-Rahman-ir-Rahim
Há quarenta anos, a Universidade Aga Khan recebeu a sua Licença da parte do Governo do Paquistão perante uma vasta multidão de simpatizantes. Foi uma ocasião verdadeiramente histórica – daquelas que acontecem apenas algumas vezes na vida. Encheu o meu coração e o coração de tantos outros de alegria e orgulho.
Quatro décadas depois, reunimo-nos para celebrar uma tríade de marcos históricos. Desta vez, fazemo-lo em três continentes e perante de uma plateia global, um testemunho do enorme crescimento e transformação da Universidade. E se a nossa alegria e orgulho já eram grandes em 1983, hoje serão muito maiores, tendo em conta tudo o que já alcançámos juntos e a esperança que os nossos alunos representam.
Alguns dos presentes hoje na plateia estavam aqui em Karachi no dia 16 de Março de 1983. Certamente que se recordam da boa disposição desse dia. Se lhes perguntarem, também se deverão lembrar que a dimensão da plateia excedia em muito as expectativas e o número de lugares disponíveis!
Alguns recordarão também a cerimónia que se seguiu dois anos depois, durante a qual inaugurámos o Hospital da Universidade Aga Khan e a Faculdade de Ciências da Saúde. Na altura, falei acerca do percurso difícil desde o anúncio do projeto em 1964 até à conclusão da sua primeira fase em 1985. Porque a criação da AKU foi uma tarefa imensa, com momentos de exaustão mas também momentos de exultação. Continuo grato a todos aqueles que comigo lutaram para tornar a Universidade uma realidade.
No entanto, a devoção exemplar à visão fundadora da Universidade não cessou ao longo das décadas seguintes. Os beneméritos da AKU continuam a fazer as suas doações com uma generosidade ilimitada; o corpo docente e os funcionários continuam a ser guardiões da sua cultura e valores; os seus voluntários e parceiros continuam a partilhar livremente a sua inestimável experiência. É para celebrar este compromisso continuado e tudo o que ele tornou possível que a Universidade criou o Dia do Fundador como uma tradição anual. O Dia do Fundador não se refere a uma pessoa, nem sequer a uma geração. Pelo contrário, reconhece o trabalho coletivo que faz a AKU avançar, sempre em linha com a sua missão diferenciadora: trazer conhecimento, liderança e excelência para responder aos desafios que o mundo enfrenta, especialmente na Ásia e em África, e construir pontes de compreensão entre países, culturas e religiões.
Na base desta missão estão várias convicções fundamentais. Numa altura em que avançamos com confiança para a nossa quinta década, nunca houve um melhor momento para revisitá-las.
Estas convicções incluem a crença de que a busca pelo conhecimento não é uma ameaça à fé, mas sim o seu complemento natural. Como escreveu o filósofo Al-Kindi há mais de mil anos: “A verdade não diminui ninguém, mas a verdade enobrece qualquer um”. A convicção de que África e a Ásia podem dar grandes contribuições à inovação a nível global. Que os altos padrões não são um luxo do qual se pode prescindir em cenários de baixos rendimentos, mas sim uma fonte de progresso. Que a diversidade é uma bênção e não um fardo, e que metade do talento do mundo – pelo menos – está na mente das mulheres.
A estes princípios podem ser acrescentadas várias observações importantes. Entre elas, a de que o mundo entrou numa nova era, a da sociedade do conhecimento, na qual a realização intelectual molda decisivamente o destino dos indivíduos e dos povos. Que, numa era de polarização, as instituições fortes da sociedade civil podem ser a cola que reagrupa os segmentos divididos de uma comunidade. E, crucialmente, que todas estas perspetivas podem ser unidas e tornadas reais em milhões de vidas através de uma instituição excecionalmente poderosa. Ou seja, uma universidade moderna.
Embora tenha sido fundada com base em convicções profundamente arraigadas, ninguém deverá pensar que o sucesso da AKU era inevitável. A Universidade foi concebida em plena invernia da Guerra Fria, numa altura em que as grandes expectativas criadas pela descolonização estavam a enfrentar uma realidade irredutível. Ela ganhou forma num momento de crise para o ensino superior no mundo em desenvolvimento. Em toda a Ásia e África, as universidades estavam com dificuldades em dar resposta às expectativas elevadas, levando muitas a questionar por completo o seu valor. No estrangeiro, os especialistas argumentavam que os países com baixos rendimentos deveriam gastar os seus escassos fundos no ensino básico e não no ensino superior. Os planificadores da AKU estavam a nadar contra a maré.
O maior crescimento da Universidade ocorreu durante um período de transformação local e global, num período em que o fim da era dos dois blocos deu origem a uma era de tremenda incerteza. Devo dizer: a nossa ousadia perante estas circunstâncias causou-nos alguma apreensão. As dúvidas abundavam. Seria a visão da Universidade capaz de granjear o apoio dos seus diversos constituintes? Conseguiria atingir valores de referência internacionais em matéria de qualidade, mantendo-se simultaneamente acessível aos menos favorecidos? Se fosse possível encontrar esse equilíbrio numa instituição de escala limitada, seria capaz de criar uma dinâmica de crescimento?
Quarenta anos depois, todas estas perguntas obtiveram respostas afirmativas – se não para sempre, pelo menos no momento presente. A Universidade tem amplamente justificado a fé dos seus defensores. As conquistas da AKU são muitas, variadas e em cada vez maior número. Elas são para mim uma fonte de grande felicidade. Entre as mais recentes está a sua entrada nos rankings globais das principais universidades. Parece que a AKU, como era minha esperança, está “a captar a imaginação do mundo”. Tal deve-se à dedicação das suas gentes, ao sucesso dos seus ex-alunos, à generosidade dos seus beneméritos e voluntários, e ao apoio que tem recebido de instituições governamentais e do sector privado a nível local e internacional.
Mas, em vez de estar listar os seus louros, mencionarei aqui apenas aquela que me parece ser a mais memorável das conquistas da Universidade: ter-se tornado uma fonte de esperança para tanta gente. Desde os pacientes que procuram aliviar o seu sofrimento nos hospitais da AKU aos pais que sonham em ver os filhos vestirem os trajes de formatura – o nome da AKU evoca esperança. Não há nenhuma força mais poderosa ou mais necessária hoje em dia. Quando plantamos esperança na vida das pessoas, aliviamos todos os seus fardos. É uma fonte de energia e inspiração que é infinitamente renovável.
Não deixarão de surgir obstáculos às ambições da AKU nos próximos anos. A mudança nos nossos vários contextos será contínua – parece inclusive provável que venha a acelerar. A Universidade deve manter um olho fixo no horizonte, evoluindo e adaptando-se às novas circunstâncias. Ao mesmo tempo, deve manter firmemente diante de si a sua visão fundadora. Uma grande universidade não se constrói em poucas décadas, nem mesmo ao longo de uma vida.
O propósito da AKU deve permanecer lúcido e constante, transcendendo as gerações, mesmo tendo de renascer na paixão e no compromisso de cada nova geração.
Hoje, tal como em 1983, o futuro da Universidade está nas mãos dos seus líderes, professores, funcionários e apoiantes. Depende em igual medida da excelência dos seus alunos e ex-alunos. Tenho uma profunda fé de que a Turma de 2022 continuará a acrescentar glória ao nome da Universidade, seja a partir das suas salas de aula e clínicas ou através de instituições igualmente vitais e conceituadas.
Todos nós em conjunto somos os guardiões do sonho fundador. A nossa história dá-nos todas as razões para acreditar que, enquanto permanecermos fiéis a esta visão, a luz da AKU – a luz representada no selo da Universidade – brilhará cada vez mais, ajudando a iluminar o caminho rumo a um futuro melhor para as pessoas para quem trabalhamos.
Caros diplomados, o meu desejo hoje é que experienciem a alegria de plantar esperança na vida das pessoas, de construir pontes de compreensão, de se aventurarem nas águas desconhecidas onde novos conhecimentos são descobertos. Que o vosso futuro seja rico em desafios abraçados e superados. Sejam ousados perante a incerteza e verão a vossa ousadia recompensada.